segunda-feira, 21 de dezembro de 2020

 

 

 

TETO

Há o cantar dos pássaros

O canto da praia

E o canto de rua

Estrela sem céu nem mar

Relento sem ninguém para amar

Lento o tempo

Passos lentos

Acalento

 

Na calçada sujeira e lágrimas

Lembranças de uma glória que ignora

Os olhos que choram escondidos

No sujo da cara e da roupa

Escondido, encardido, apagado.

Pagando o preço

Sendo tragado pelo desespero

Desenganado

Calado

 

Estava mudo

E só assim

Ouviu os passos do amor pela calçada

 

O sorriso de luz

O coração (que nem Jesus)

Ah! Quem é aquela mulher:

Linda

Forte

Doce...

Inspiração de poesia e canção

Sua nova melodia

Sua nova moradia

A mulher com uma missão.

 

Não tropeça não se desvia

Irradia

Espírito de luz na escuridão


Mão estendida

Asas abertas

Como as portas do seu coração

Onde mora o amor

 

Amor que abraça

Amor que caminha lado a lado

Amor que carrega no colo

Amor que sara feridas

Que com choro limpa a alma

E com sorriso espelha nova vida

Amor que mata a fome

E ainda aperta a mão

Amor que protege do frio

Dando o cobertor e a oração

 

Ah o amor...

Que ressuscita o violão

Amor que chega aonde quer

Quer você queira, quer não!

 

Amor na ponta dos dedos

Nas cordas

Acorda-nos, canção.

Porque o mundo é vasto

E a vaidade devasta

Nosso tolo coração

 

Mas os anjos pintados no teto

Descem ao chão

Caminham pela calçada

Salvam-nos da perdição

 

Deixam rastos que não vemos

Sementes numa lição

Nos nossos primeiros passos

Prelúdio

De uma oração

De uma prece, talvez.

Da própria ressurreição.

 

08.09.2020


Para Mari de Miranda e Elias Belmiro






domingo, 31 de maio de 2020

Moça

                         

  Poema épico escrito entre os dias 26 e 28 de maio de 2020.


Estatística: 11 páginas
                   1116 palavras
                   5290 caracteres sem espaço
                   6098 com espaço
                   325 parágrafos
                   469 linhas




Moça


Moça
Do sorriso doce (da feira)
De caminhar leve como o vento
E de olhar tranquilo
Como um sono bom.    

Moça que eu vi passar
Vestido de fino tecido esvoaçante
De colorido simples
Cobrindo vigorosas formas.

Ver-te assim
Tão solta quanto seus cabelos
Faz pensar que povoas sonhos
Exilando seus pesadelos

Ao caminhares pela rua
Em qualquer dia ou direção
Segues a linha do destino
Que atará seu coração

A outro maior talvez
Se sorte tiveres de ser feliz
Ou ao abismo da solidão
Como eu um dia fiz.

Ah coração!
Se apenas um caminho tivesses!
Sem encruzilhadas
Numa só direção...
Se não tivesses asas
E nem uma ilusão...
Serias o abrigo do amor.
Do amor a dois
Belo agora e depois
Inquestionável
Inabalável
Incomparável
Cômodo e correto
O amor a dois, completo!
Com alianças e afeto
Álbum de fotografia
Porta retrato
Futuro certo
Como dois e dois são quatro
Como oásis no deserto.

Sim, existe o desvio,
Às vezes escuro e frio
Às vezes cheio de luz
São infinitos os caminhos
Multiformes os sinais
Descompassadas as emoções

A solidão não é desamor
É amor demais, talvez...
Fragmentado, fracionado
Subdividido
Com valor alterado
Que as regras não comportam
Da matemática
A valiosa vírgula mutante
Do português
A longa reticência
E como se mede o amor
Usando a tão vasta ciência?

O amor de um coração sozinho
Que segue em frente
Ao longo do caminho
Que sabe o tempo
O sempre e o nunca
Conhece do chão
As pedras e as sementes
E que se alegra na chuva que cai.

O coração sozinho
Alterna entre céu e ninho
Abre-se como raio de sol
De luz, calor e vida.
Em delírio
Encontra a chuva
Paixão
Alucinação multicolorida
Que encanta, inspira,
E se desfaz no ar
Sem deixar marcas
Iris a desbotar

Diante da midríase
Da realidade do olhar
Do jogo de luz e sombra
Do mito da caverna de Platão
Reconhecer-se nas pedras
Apenas projeção
De sentimentos e sentidos
Em reflexos de solidão

O coração sozinho
Trilha e cruza caminhos
Cruza outros como ele
Completamente sem rumo
Sem eira, beira ou prumo.
Contrastando em solidez
Solitude
Solidão
Incompletos, desconexos,
Seguem em outra direção
Nunca chegam
Nunca param
Nunca cumprem a missão
Não comparecem à missa
Fogem ao amém
Fazem à sua maneira
A maneira do além
Em frente é a direção
Não têm lado
Para terem ao lado um alguém
Um coração sozinho
É de todos e de ninguém.

Coração
Abrigo de sentimentos
Da dor que os olhos veem
Absorvem a todo o momento
Concentram-se na luz
Choram por dentro

Ao verem o mundo cão
Agonizando sem salvação

Não é a bomba o único terror
O medo nasce bem cedo
O fogo do inferno incendeia florestas
A ambição cega alimenta a dor
Devoram-se os homens
Enquanto os rios morrem
Secos, sujos, desviados e invadidos.
O ar agora é veneno
Que as chaminés às nuvens anunciam
E a sirene move o homem
A máquina humana contra o vazio
Do bolso e da alma
Do fundo do prato que não traz calma
Ah! A fome!
O mal maior do homem
Que com ele acaba

As lentes trouxeram registros
De um mundo longe do nosso
Onde em vez de sorrisos
Os homens exibem ossos
Têm olhos esbugalhados
Misto de esperança e dor
Almas doloridas e secas
Pele estranha e sem cor.

A indiferença
A distância
A ausência
A ignorância
O egoísmo
A ambição
O capitalismo
A crença
A maldição
Tudo isso na mesma foto
No fato
Na visão
Na mentirosa e falsa proteção
Estamos imunes a isso?
Ah, não estamos, não!
Não
Somos culpados
Cúmplices e sem noção.
Irresponsáveis
Sem coração
Somos desumanos
Não irmãos
Monstruosos
Terríveis
Covardes
Estamos longe da evolução
Primitivos
Primatas
Raça de cão
Crueldade sagaz
Somos a condenação
Tudo o que deu errado
O pior
O não!

A raça humana é a vergonha do planeta
Estúpida
Cega
Devastadora
Animal
A raça humana é  proliferação do mal
Em conceito de superior
Em conceito de igual
Em conceito de errado e certo
Em conceito de normal
Aceita seu próprio ódio
Como coisa natural
Odeia
Odeia e mata
Primata
Animal

O homem segue o caminho
Caminho de sangue
Sangue e dor
Dor de tortura e morte
Crucificação do único amor
Do Deus humanizado
Carne, sangue e dor.
Mas há vida além da morte
Ressurreição
Quer você queira
Quer não

Onde termina a escolha
E vem a perfeita lição
Quantos fizeram o bem?
Uma rara exceção
Só esses e apenas esses
Somente esses saberão!

Sabe-se hoje da vida
Da modernidade e sua tensão
Da tecnologia que reina
Da exigente evolução
Do homem que vai a lua
Explora Marte em expedição
Lança satélites
Atravessa nebulosa
Enumera constelação
Desvenda a rota da Terra
Desconhece seu coração
Teme olhar para si mesmo
Assombra-se com seu irmão
Perde-se no abismo da alma
No vazio da contradição.

Contra o mal
Caminha a moça
Segue a linha do destino
Emaranhando sentimentos
Tecendo sentidos
Emoções
Que com o passar dos dias
Passo a passo
Passam...

A moça agora saiu de cena
Foi pra casa
Mas não descansa
Em seu oficio
Viaja o mundo
Escreve páginas
Dança!

Condicionada aos bastidores
Aprimora o espetáculo
O público é seleto
O resultado imediato
Enquanto o mundo lá fora
Sofre a maior transformação

O mundo hoje chora
Isola-se
Há confusão
Homens perdidos
Mutilados
Devastou-se a multidão
No império da inutilidade
Do descontrole
Da contradição

Portas fechadas
Covas abertas
Olhos atentos
Destruição

Hoje o orgulho caiu por terra
Não foi a guerra
Nem o canhão

A semente das escolhas
Brotou em condenação
Alterou valores
Comportamentos
Revisou a rota
Abriu a contramão

Invisibilizou-se feroz
Minimizou a existência
Em sobrevivência
Em simples permanência
Em nós.

Desfez-se assim toda aparência
Em duas camadas de tecido
Cobrindo o rosto em proteção
Aquém das grades que é seu reinado
Sua casa
Ocasião
Em que tudo foi revisto,
Refeito
Reconhecido
Redescoberto
Reinventado
Onde a ostentação
Deu lugar aos joelhos dobrados
Onde a oração se revelou
Um tempo presente
Que altera o passado
Que é de luz
Luto e dor
Um tempo novo
Inusitado
Que não se sabe se vai passar
Que segue rugindo e estremecendo
De maneira bruta e singular
Que a todos atormenta
Assusta
Assombra
Assola
Estar vivo nos consola
Para os feridos consolar
Mais partidas que chegadas
Mais pra ir que pra ficar.

E os gráficos infelizes
Não sabem como registrar
A humanidade chora
Sobrevivamos pra contar!

O plano não nos pertence
Nem o roteiro ele nos dá
Enquanto Deus nos dirigir
A vida prosseguirá

Grandeza e poder
Justiças a Deus pertencem
Esse tempo não é nosso
Aqui estamos
Simplesmente

Caminhando
Vivendo
Aprendendo intensamente
Se há aqui amor
Amemos
Infinitamente!



Hyeda de Miranda Campos  28. 05.2020                           16:40