quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Diário de um ALDEÃO






DIÁRIO DE UM ALDEÃO

Aqui no Vale, tudo é calmo,
Tem apagão, mas tudo é claro.
O povo rasga o chão,
Com mãos cheias de calo;
Seguem o destino:
CRETINO!!!
A olhar os que o avassalam,
Carregando-os nos lombos, como cavalos.

Selvagens? Quem me dera!
Que fossem fortes e ousados
Contra o que os dilacera!

Hoje a noite não tem fogueira,
O Coronel não está para brincadeira.
Tem gente acordado
Vendo onde o RIO deságua.

Isso é perigo! Não é brincadeira!
Vá que um simples aldeão
Aventure-se a contar histórias
E acabe com esses dias de glória!

Cale-se, aldeão!
O Coronel não está para brincadeira,
Até seu jagunço predileto
Pode se queimar nessa fogueira.

E a Maria Bonita, então?
Pense nela, aldeão!
Está no escuro
Se retiram do posto o seu Lampião!
Se uma gota de excessiva vaidade
Lha apaga a vela da ilusão...
Pense nela, aldeão.

Quanto aos famintos, não se preocupe...
O que pode você fazer contra a situação?
Quando Deus é quem recebe a culpa,
E o jagunço distribui, na fila, o pão.
É um povo feliz, aldeão!

Celebram a miséria humana com suas vidas.
Lotam as filas, que alegria!
E suas filhas se prostituem a cada dia.

São mortos honrados
Em placas que dão nome as ruas,
Onde seus entes sobrevivem anônimos,
Desabrigados, de pele nua!

Mas não se incomode com o povo
É raça feliz!
Quando discursam na praça,
Comem de graça e pedem bis.

Fazem parte da aldeia...
Acredite se quiser!
Dão o sangue de suas veias
Para serem chamados de Zé.

E quando vem o inverno,
Vem também a festança.
Se a vida é um inferno,
Todo mundo dança!

Cachaça boa faz mendigo ser rei
E o povo brinda à igualdade que,
Onde está não sei!

Acende a fogueira,
Como honra para os visitantes.
Dorme no sereno e na poeira,
Cartão postal para nossa estante.

Não se preocupe aldeão,
Com o desemprego, nem com a fome.
Não é problema seu.
Isso depende do “homem”
E da solução que ele prometeu.
Além do mais ele é “doutor”!
E você, aldeão,
Só perdeu o sono quando trovejou;
Temendo pela sua palhoça.
Mas aqui o vento é manso
E a chuva veio salvar a roça.
Não se preocupe aldeão
Havendo calamidade,
A notícia se espalhará pela cidade,
E o Coronel usará de sua autoridade.

Agora, por favor, adormeça;
Feche este livro e esqueça.
Amanhã é dia de trabalho, adormeça.
Porque se sua carga ficar pela estrada,
O Coronel pedirá sua cabeça.
Se sua poesia despertar pela aldeia,
Haverá tempestade para que ela escureça.

Fechando os olhos, sinta o perfume da terra;
Terra fértil do seu próprio chão.
Debaixo dela, sementes;
Em cima, corrupção.

Não adianta esperar o brilho do sol.
O que adiantaria a esperança,
A alforria,
A eleição?

Não se incomode com o povo
É raça feliz!
Quando discursam na praça,
Não entendem a desgraça;
Bebem cachaça,
E pedem bis.

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