quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Camila em intervalo de sonhos


Camila em intervalo de sonhos.

Desperto então da solidão dos sonhos através dos lençóis e seus misteriosos caminhos.
            Levanto-me e nenhum corpo me seduz de volta, nenhum braço me envolve, nenhum sorriso me ilumina... Levanto-me mesmo assim!
            No espelho meus olhos navegam em busca da alma. Meus cabelos expressam o conformismo e a lógica da negritude da noite contornando meu rosto pálido.
            Um minuto apenas para explorar toda a aquarela da vitalidade e definir quem serei neste dia. Assim vou maquiando minha máscara humana e visível que me iguala a todos os mortais.
            Olhos neutros, sorriso natural, sincero e espontâneo, sempre disponível. Alguns traços guardados de surpresa para usar quando contarem estórias em busca de resposta ou pura atenção. Preciso retocar as sobrancelhas para que a serenidade se fixe nesta máscara de hoje, impedindo qualquer expressão rude.
            Parece um bom rosto para encarar mais um dia de rotina criado a partir das minhas próprias escolhas.
            Os olhos da família nada leem de novo no meu rosto. No trabalho passam através de mim sem alterar meus traços.
            Nenhuma aparição miraculosa para desafiar meus sentidos no decorrer de todo o dia.
            O pôr do sol acontece sinalizando que há vitória e que a noite vem para celebrá-la.
            Hora de voltar para casa. E parece tão longe este lugar!
            Quando encerrada a porta do quarto parece me separar do mundo. No espelho nova viagem dos olhos perdidos que por milagre têm a ilusão de cruzar os teus.
            Tua imagem se espalha pelo quarto. Teus olhos perfeitos, tão fortes, tão fartos de brilho raro de magia e cores.
            Teus lábios perfeitos, vivos, minuciosamente traçados para abrir-me em sorriso o portal do amor.
            Teus cabelos, todo meu ouro reluzindo ali ao simples toque dos teus dedos.
            Cores contornam teu pescoço como em um abraço. Joias reluzem refletindo tuas escolhas e realçam tua personalidade.
            A perfeita simetria do teu corpo desafia a realidade e em um leve movimento teu estou cativa.
            Pedaços de vidro no chão não podem agora dizer quem sou.
            Aquarelas desfeitas, desmascarado o meu coração.
            O vento atravessa a janela, faz dançar a vela, faz brilhar a luz dos olhos teus. Espalha no ar o perfume do encontro, o som da tua voz e o sorriso meu. Também dançamos com ela, corpos, almas, sombra, calor de amor e vela.
            Cheiro de ervas do jardim deserto onde a chuva não desceu do céu.
            Nossos lábios têm sede do suave veneno do amor, mas provamos o chá dos sonhadores, para adormecer e separar sem se lembrar, sem sentir dor.
            Despertar para mais um dia, em um mundo desconhecido, onde ficaremos esperando o amor. Despertar para a normalidade. Para a rotina. Para a lógica e triste lucidez da vida.

(Dama do Vale – 14 de dezembro de 2020)
 
            

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